Uma medalha para o Avô...
Hoje, dia em que se celebra o 483º aniversário da elevação de Angra do Heroísmo a cidade, serão atribuídas, em sessão solene, medalhas municipais a personalidades e instituições do concelho. Uma delas, a título póstumo, será para o meu avô materno, Fernando Augusto de Sousa, numa distinção aprovada mediante proposta dos vereadores do PSD na autarquia, sobre uma iniciativa minha. Já o disse, e repito, que não são apenas o amor e a admiração de neto que me levam a ver no meu avô uma pessoa que marcou a nossa terra. Partilho essa opinião com gente que sabe o que diz, e que soube admirar nele um arquitecto e um cidadão - com virtudes e defeitos - que deu, que inovou, que despertou talentos e que, de alguma forma, inspirou gente que os tinha. Sei que ele era assim, porque fez tal e qual isso - também - comigo...
Sem muitos predicados, mas lamentando que apenas 24 anos após a sua morte - e por iniciativa de um familiar direto - esta terra socialista homenageie um técnico, professor e político que o soube ser à sua medida, deixo aqui o texto original, enviada à digníssima Câmara de Angra, com a menção inicial à Medalha de Honra Municipal, depois passada a Medalha de Mérito Profissional:
Proposta
Medalha de Honra do Município (a título póstumo)
FERNANDO AUGUSTO DE SOUSA, Arquitecto
Fernando Augusto de Sousa nasceu a 26 de abril de 1913, no Porto, onde se formou em Arquitectura pela Faculdade de Belas Artes, chegando a laborar na Câmara Municipal daquela cidade. Em 1945 desenhou e orientou a recriação do Pelourinho da Sé Catedral do Porto, que recuperou um exemplar do século XVIII. Nessa mesma década, veio viver para a Ilha Terceira, terra natal do seu pai, António Joaquim de Sousa Júnior, ilustre praiense, médico e político, professor da Faculdade de Medicina do Porto e, entre outros cargos, Ministro da Instrução na Primeira República e Presidente do Senado Municipal do Porto.
Fernando Augusto de Sousa chegou a ser o único Arquitecto em funções na Ilha Terceira, tendo-se estabelecido em Angra do Heroísmo, onde viria a ser o Arquitecto Municipal durante vários anos. Fez parte dos quadros da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo em várias fases de mudança para a cidade. Do seu estirador nasceram dezenas de obras marcantes para o crescimento do concelho, realidade extensiva a outras ilhas da Região.
Dessas obras podem destacar-se, ao longo de várias décadas, todo o traçado das Avenidas, na parte nova da cidade de Angra; a original Praça Almeida Garrett; os edifícios e estruturas dos Celeiros em várias ilhas dos Açores; a Casa de Trabalho do Nordeste (São Miguel); as primeiras oficinas da Empresa de Viação Terceirense; a primeira Fábrica de Laticínios da Ilha Terceira (Grota do Vale); a Igreja Nova dos Biscoitos; o estudo do que viria a ser o Hotel de Angra; o edifício da Oceânica (Praia da Vitória); o prédio de apartamentos da Auto Angrense; diversas estruturas civis e militares na Base das Lajes; o Cemitério do Porto Martins, a Glorieta de homenagem a Almeida Garrett no Jardim Duque da Terceira e um sem número de habitações e espaços comerciais, onde ainda hoje é visível o arrojo do seu traço, que inovou visivelmente a realidade local. Colaborou ainda com várias das principais empresas de construção civil da Terceira e da Região.
Na década de 50 fora nomeado Professor da Escola Industrial e Comercial de Angra. E até meados da década de 80, quando se reformou apenas como Professor da então Escola Secundária de Angra do Heroísmo, passaram pelas suas aulas de Desenho, Geometria Descritiva ou História da Arte, muitos dos técnicos (Arquitectura, Engenharias, Pintura, etc) que marcaram a segunda metade do século XX na nossa ilha. E muitos que ainda hoje são referência ativa nessas áreas.
Foi dirigente, durante vários anos, do Instituto Açoriano de Cultura e, ainda hoje, o presidente de maior longevidade na Assembleia Geral da Fanfarra Operária Gago Coutinho e Sacadura Cabral.
Marcante foi ainda a sua intervenção política, mormente durante o Estado Novo, em que fez parte, de forma extremamente ativa, dos movimentos de oposição ao Regime, apesar de manter as suas funções profissionais públicas e pedagógicas, e de ser um cidadão interventivo na sociedade local. Foi um dos principais dirigentes regionais do Partido Socialista no pós-25 de abril, funções que acabaria por abandonar passado alguns anos.
Visto por muitos como um homem à frente do seu tempo, consideramos que o Arquitecto Fernando Augusto de Sousa - que faleceu em janeiro de 1996, nesta cidade de Angra do Heroísmo, que escolheu como sua terra durante mais de meio século - é merecedor, na sua memória, da Medalha de Honra do Município, atribuída a título póstumo.
Angra do Heroísmo, 11 de maio de 2017