![Como sempre, a vontade do povo é soberana...]()
As eleições do passado domingo revelaram uma ténue vontade de mudança dos angrenses, contrariamente à voz comum, e num sentido inverso ao que as expectativas pareciam querer demonstrar. Logicamente que, e mesmo tratando-se de um sufrágio onde a proximidade e a individualização imperam, as autárquicas não estarão de todo desligadas da realidade nacional, ainda mais quando antecedidas por uma consulta popular que revelou exactamente o mesmo que no nosso concelho: mudar, mas não tanto.
Não alcanço nitidamente os objectivos em massa que a retirada de uma maioria quererá indicar, mas facilmente nos podemos aperceber de que as ligações ao poder, ainda mais quando ele se vai perpetuando no tempo, são extremamente eficazes nas alturas de pré-campanha eleitoral, mais não sendo pelas silenciosas pressões que os derradeiros quinze dias dedicam à vontade de expressão nas urnas. Ainda assim nunca vou compreender que alguém se situe num campo de votar “porque tinha de ser assim”, naquele que é um dos actos mais solitários da nossa sociedade. Mas é a que temos e não basta aconselhá-la, há que tentar destrinçá-la…
Já por diversas vezes, e em termos profissionais, acompanhei campanhas eleitorais. Desta feita, e no caso concreto de Angra, estive directamente envolvido num dos projectos apresentados, daí retirando que o facto de se passar claramente uma mensagem não desvirtua que quem não quer ver nem ouvir está no seu direito. A alternativa proposta consubstanciava-se numa participação popular como nunca houve entre nós, coisa que pelos vistos não foi aceite de bom grado, para além da já frisada individualização do contexto autárquico, face à qual os angrenses preferiram seguir o atribulado rumo perspectivado a década e meia. Confesso que pouco me iludi, pois bem conheço estas gentes, que de festeiras e consignadas muito têm, o que se veio a verificar ser certo e sabido.
Poucos dias após o sufrágio de 11 de Outubro, logicamente se levantam as dúvidas sobre a próxima actuação municipal, uma vez que a gerência do concelho se apresenta bem diferente, no que se refere à maneira de agir mais célere e cortante face às vontades contrárias. Para bom entendedor, não será difícil descortinar até onde poderá ir a ruptura com o passado na gerência concelhia, afinal são conhecidos pontos fracos em termos de sustentabilidade financeira, a que se juntarão outros onde a inabilidade operativa se foi vincando, e que verão certamente na privatização ou afim algum laivo de salvação.
Uma coisa é certa, bem se poderá agradecer à anunciada candidatura do voto útil a mudança do cenário, não sendo lícito que todos os votos perdidos pela maioria que elegeu José Pedro Cardoso em 2005 se tenham transferido daí para as hostes centristas – em Angra mais populares que na restante realidade nacional… -, mas a verdade é que daí se começou a desenhar o gráfico com que irão conviver posição e oposição nos tempos mais próximos. Exactamente os mesmos que verão nascer uma exorbitante zona verde a ligar o jardim à Memória. Em que se vai passar dos estudos à prática para um exorbitante cais de cruzeiros, duplicando estruturas numa ilha que vai vendo a Praia da Vitória descolar nas movimentações regionais. Em que se assistirá a uma renovação tal da face visível da cidade, daí que será também exorbitante, que não mais a reconheceremos como tal. É ver por esse prisma o porto das pipas, a eternamente requalificada baía, o parque industrial, os esgotos e seus odores, o trânsito os passeios em que tropeçamos, os menos claros financiamentos de algumas actividades e outras exorbitantes coisas que, bem diz o adjectivo “saem da órbita; excedem os justos limites; são excessivas; ou demasiadas”...
À nossa jovem autarca – contando que tem menos uns meses de idade do que eu – naturalmente se deseja a melhor defesa possível dos interesses da cidade e do concelho, afiançando-lhe que, para isso, será preciso bater o pé ao executivo do partido que representa. É que no ar subsiste a dúvida de quem realmente manda e decide Angra, assim como a mudança do cenário regional autárquico colocou diversos interesses de primeira ordem a solicitarem mundos e fundos ao governo de César. O tal que tem dinheiro para dar e vender – salvo seja… -, mas que nunca se deparou com tal abundância de mãos estendidas em troca dos domínios outrora laranja…