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PORTO DAS PIPAS

miguel sousa azevedo - terceira - açores

PORTO DAS PIPAS

miguel sousa azevedo - terceira - açores

E nós preocupados com cada coisa…

16.05.24, MSA

Foto Cronica 184DI MAI24 - E nós preocupados com

Já todos abrimos o armário de manhã e torcemos o nariz porque não era nada daquilo que queríamos vestir. Pensei precisamente nisso quando vi as primeiras imagens das impressionantes cheias que atingiram o Rio Grande do Sul, no Brasil, e que até agora desalojaram cerca de 500 mil pessoas.

Recuei igualmente à infância, e às agruras do Sismo de 1980, quando a enorme solidariedade minimizou consequências e acelerou a reconstrução. Mesmo com várias dezenas de vítimas mortais, a verdade é que a nossa terra tremeu, a ilha ruiu parcialmente, mas conseguiu-se logo ver o que levantar, o que refazer, o que edificar de novo.

Sem traçar comparações, a tragédia que atingiu aquele estado-irmão, que tem mais habitantes que Portugal de ponta a ponta, impressiona pela dimensão, que o atual mediatismo amplia, e deixou-me a matutar no valor relativo que damos ao que a vida nos ofereceu. Longe de saber o que é, de um dia para o outro, ter de abandonar a parte física dessa mesma vida. Sem apelo nem agravo.

Quem é que nunca se chateou porque o carro entrou na reserva, porque alguém faz barulho a 200 metros de distância, porque começou a cair uma chuvinha e molhou-se a roupa na corda, ou porque caiu molho na camisa? Com algum exagero, ficamos alterados por coisas tão insignificantes, que quase nunca relativizamos o que é viver um problema mesmo sério, e muito menos o que é passar por uma tragédia.

A imensa corrente de humanismo e bondade que temos visto nas terras alagadas do Rio Grande do Sul, onde também os roubos já se expressam com monta, são um exemplo de altruísmo a toda a ordem, tendo já havido vidas ceifadas também entre os que ajudavam.

Confesso que o coração me leva a ver tudo aquilo com um sentido diferente. Tenho pessoas próximas de voz, sorriso e afeto que tiveram de deixar a sua casa, sem saber o que, daqui a não se sabe quanto tempo, vão encontrar no regresso. Se houver esse regresso. Uma família distante, cuja fé e esperança me vão impressionando, mesmo se os sabemos a todos um povo lutador e, tantas vezes, sofrido.

Se uma desgraça com aquelas proporções nos pode ensinar alguma coisa, para lá de aferir a efemeridade das coisas que temos, é que devemos dar valor a cada pequeno ganho, colocando mais amor nesta vida de passagem. Apanhamos apenas uma boleia, que é breve, e que nos merece o maior respeito…

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