![Foto Cronica 164DI JAN23 - Como o tempo passa cada]()
Foi numa caminhada matinal – isso mesmo, propósitos de ano novo, melhores hábitos, exercício, blá, blá, blá… -, momento ideal para “limpar” as ideias rumo ao dia que começa, que reparei na ausência de relógio. Nada preocupante, pois os telemóveis ajudam-nos a andar sempre a horas. Mas tive de pensar nas razões…
Em anos idos, nunca sairia para correr ou caminhar sem levar o relógio e, quase religiosamente, punha o cronómetro a contar o tempo do esforço físico. Possivelmente um vício de antigo atleta, de alguém ligado a desportos em que os minutos e os segundos são lei, mas sem nada a ver com ações sistemáticas.
O certo é que isso me caiu em desuso. E cheguei à conclusão de que, mesmo naqueles hiatos em que a rotação da terra não será tão importante, já me começava a incomodar a voracidade com que se consumiam os tais minutos e segundos. Sim, o tempo está a passar cada vez mais depressa…
Sublinho que a dita caminhada se fez saindo da Madalena do Pico, rumo ao Lajido, ou seja com o Faial sempre em mira e naquele que é o mais próximo diálogo entre ilhas que temos. Até isso se tem tornado estranho, porquanto uma ida a outra ilha implicava algum – mesmo que pequenino… - tipo de mudança. E o tempo a correr nem permite que ela aconteça.
Sem aprofundar em demasia o tema – e entendo que deixar os assuntos pela rama lhes dá muito mais encanto… -, a verdade é que os avanços tecnológicos são os grandes culpados de o tempo estar a passar mais depressa. Da mesma forma que nos permitem fazer mais coisas e mais rapidamente, absorveram-nos as horas de tal modo, que deixou de haver espaço para, naturalmente, ter tempo de sobra.
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Pode parecer um contrassenso, mas se pensarmos um bocadinho nem o é. Mesmo se me refiro à minha verdade, pelo que vistas bem as coisas, só posso estar coberto de razão… mas vou dar três exemplos muito simples:
Para quem é um ilhéu consumidor de jornais, a prática semanal de aguardar uma edição vinda do continente perdeu toda e qualquer razão. Perdeu mesmo o cerimonial que possuía. Os jornais titulam o dia todo, as notícias fluem à velocidade de um mosquito louco…
O próprio contato com as pessoas tornou-se numa promiscuidade involuntária, porque todos passaram a estar contatáveis por inúmeras formas e plataformas, e isso até já transformou a maneira de ser de cada um. A nossa genuinidade vai-se perdendo ao som de alertas e alarmes…
E depois o tal fruir do tempo que passamos a ter e que agora até nos escasseia. É isso mesmo. Parecemos temporizados por um daqueles ovos de cozinha para contar a cozedura. Passámos a cronometrar involuntariamente toda a nossa vida, que quase visualizo como um amontoado de “post-its”, alguns deles já sem cor.
Mas não é um fatalismo nada disto que enuncio. É uma realidade, e ao mesmo tempo uma aprendizagem. Afinal, burros seríamos se incapazes de dar a volta a um texto que nós próprios escrevemos, pontuamos, acentuamos e partilhamos com vontade. Tudo não passa de evolução. E se a que vem de fora nos caça os passos sem remissão, então que, cá de dentro, façamos por mostrar a força suficiente de sermos nós próprios.
Acredito que isso ainda é possível, apesar das rotulagens excessivas que a sociedade capacita…até aos mais incapacitados de emitirem a sua opinião. Mas é assim que estão as coisas, e mais vale ir abrindo uns buraquinhos no sistema, do que cair na exaustão de combatê-lo…
PS – a minha referência inicial a “relógio” é mesmo sobre relógios, instrumentos mecânicos que medem intervalos de tempo e que podem ter as mais diversas formas. Não aquelas pulseiras que apitam incessantemente a ansiedade global…
![153 Como o tempo passa cada vez mais depressa - DI]()