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Nos Açores não temos rios. Temos ribeiras, pequenos cursos de água, que nos habituamos a apreciar quando nelas a corrente está mais ou menos viva. À nossa dimensão, nas ribeiras encerra-se um misto de sobrevivência e pacatez. São ainda, muitas delas, sulcos abertos por vulcões passados…
Nas margens das nossas ribeiras, e esquecendo os maus tratos – cada vez menos comuns, felizmente – a que alguns as sujeitaram ao longo dos tempos, a natureza mostra-se de um outro modo. Para lá do que significam para algumas culturas, espécies endémicas e mesmo a concentração das populações.
Como no resto do mundo, à volta das ribeiras as cores são diferentes, à volta das ribeiras pode haver brincadeiras, sonhos e belas imagens. Dão nome às terras, originam alcunhas, e certamente que por elas passaram tantos dos nossos amores.
Quando saímos do sossego destas ilhas atlânticas – e acreditem que ele continua a ser o nosso bem mais precioso… - as ribeiras perdem-se num mais extenso território. E qualquer açoriano nota o seu crescimento de horizontes quando vê um rio. Daqueles grandes, mesmo. Mais ainda, quando o atravessa numa ponte.
Não será pois difícil, para um indígena destas pedrinhas de bruma, criar laços com uma passagem de água com mais caudal, com uma corrente mais forte, com mais gente ao seu redor, com uma nascente desconhecida e uma foz que até a poderá ligar ao mar das nossas existências.
Nos últimos dias, passei por alguns rios que já conhecia. E pensei nisso, sem sequer retirar as ideias do retângulo luso, eu que ainda cheguei a quase ter de decorar rios e afluentes, numa realidade que a pedagogia atual afasta, mas que me deu esse aparente conhecimento.
E não há coisa melhor de sentir, quando chegamos a sítios que eram apenas designações, do que a criação dos tais laços. Por vivência, gosto, influências ou meros acasos.
Acontece, quando o mote é o rio, no Tejo, no Douro, no Mondego, no Minho, no Sado, no Lima ou no Guadiana. É uma ligação umbilical à água, ao vento sobre a água, à melancolia que nos fornecem, e que por vezes transformamos em sorrisos ou suspiros.
O certo é que, num ápice, se foram mais alguns dias por terras nortenhas, onde o (meu) coração se alimenta e onde é impossível passar sem viver. A cada regresso ou partida, há sempre a saudade guardada na curva do rio. Onde descansam bocadinhos nossos.
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