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PORTO DAS PIPAS

miguel sousa azevedo - terceira - açores

PORTO DAS PIPAS

miguel sousa azevedo - terceira - açores

O Chico da Anica.

29.02.08, MSA

Hoje morreu o "Ti Chico". Há já dois dias que sabíamos que uma operação de rotina tinha revelado um problema inesperado que, infelizmente, se mostrou sem solução.

Sendo sabido que os pais dos nossos amigos se tornam igualmente pessoas de quem gostamos e com quem o convívio se torna natural, afianço que, neste caso, até foi ao contrário pois lembro-me do Sr. Francisco ainda antes das primeiras memórias com os filhos Frank e Steven. Lembro-me da pequena mercearia na Guarita, onde ia às compras com o meu avô e onde, com a rapaziada da escola, lá se deixavam umas "gamas" ou rebuçados na conta mensal do pai de um deles. Mas sempre coisa pouca para não dar chatices. Daí até à inauguração do seu "Americano" os anos já andavam depressa.

E passaram-se e criei com o meu querido companheiro Steven uma ligação forte, como acho que têm quase todos os que o conhecem. O ar bonacheirão e amigo de rir do pai estava sempre ali ao lado e, pelos vistos, bem sucedido geneticamente pelos dois "rapazes", como ele dizia. Revelando sempre que o seu Steven era "mais à sua maneira", o "Ti Chico" foi uma figura que nos acompanhou na vida, semana após semana, sempre com a sua graça e a resposta carismática:

-Ti Chico, está tudo bem?

-É um jovem...é um jovem! -dizia-nos sempre.

Mais do que recordar os muitos momentos de conversas breves e a sua atenção para com a minha Anita, a quem tratava sempre por "aquela pequena do continente", estas linhas são apenas de tristeza. Riscada algures por uma gargalhada de quando ele andava no meio da "canalha" e nos dizia que no seu tempo "é que que tinha sido"...

E o tempo do "Ti Chico" refugiou-se agora nessas lembranças. Fica uma lágrima e, acima de tudo, um abraço muito forte. A quem foi e a quem fica. Descansa, "Ti Chico"...

Olimpismo.

29.02.08, MSA

Quando faltam exactamente 160 dias para a abertura dos Jogos, e após a recente vitória de Ana Dias na Maratona de Sevilha (obtendo o respectivo mínimo olímpico...), são já 47 os atletas portugueses que compõem a delegação nacional para Pequim'2008:

 


 

Atletismo (23):
200 m: Arnaldo Abrantes e Francis Obikwelu
5.000 m: Jessica Augusto
Maratona: Hélder Ornelas, Paulo Gomes, Ana Dias, Leonor Carneiro e Marisa Barros
400 metros barreiras: Edivaldo Monteiro
3.000 metros: Sara Moreira
20 km marcha: João Vieira, Sérgio Veira, Susana Feitor, Inês Henriques e Vera Santos
50 km marcha: António Pereira e Augusto Cardoso
Salto em comprimento: Naide Gomes
Triplo Salto: Nelson Évora
Salto com vara: Elisabete Tavares ou Sandra Helena Tavares
Lançamento do peso: Marcos Fortes
Lançamento do martelo: Vânia Silva
Lançamento do dardo: Sílvia Cruz

Ciclismo (3):
Três atletas a nomear (fundo) e um atleta a nomear (contra-relógio individual), que será um dos três que participam em estrada

Judo (1):
Telma Monteiro (-52 kg)

Natação (7):
Tiago Venâncio (100 e 200 livres), Fernando Costa (1.500 livres), Pedro Oliveira (200 costas), Diogo Carvalho (200 estilos), Carlos Almeida (200 bruços), Diana Gomes (200 bruços) e Sara Oliveira (100 e 200 mariposa)

Tiro (1): João Costa (Pistola Livre)

Tiro com armas de Caça (1): Manuel Vieira da Silva (Trap-Fosso Olímpico)

Taekwondo (1): Pedro Póvoa (-58kg)

Trampolins (2): Ana Rente (feminino), Diogo Ganchinho (masculino)

Vela (8): Afonso Domingos/Bernardo Santos (Star), Álvaro Marinho/Miguel Nunes (470), Jorge Lima/Francisco Andrade (49er), Gustavo Lima (Laser) e João Rodrigues (Prancha radial)

Parabéns, Sofia!

29.02.08, MSA

Pelo segundo ano consecutivo a atleta terceirense Sofia Pires sagrou-se Campeã nacional de provas combinadas em pista coberta.
Agora, a ambição da Sofia é a presença na Taça da Europa de Atletismo. Numa altura em que a modalidade está resumida nos Açores a poucas individualidades que se destacam, e bem longe das dezenas de miúdos que enchiam as pistas há uma década e meia atrás, a Sofia é um exemplo de trabalho, humildade e persistência. Força!

 



 

Mar: É possível fazer muito mais!

28.02.08, MSA

Os intervenientes Jorge Vieira, João Rodeia, Paulo Ribeiro e João Monjardino.

 

Ontem à noite prosseguiu a série de encontros “Ideias & Debates”, tendo sido o mar, na sua vertente lúdica e de conhecimento, o mote dado pela organização para mais uma sessão aberta ao público e cujo objectivo é simplesmente pôr a sociedade açoriana, e particularmente a terceirense, a discutir as temáticas actuais que mais a afectam.

“Porque andamos de costas voltadas para o mar?”, foi a questão fulcral da introdução feita por Paulo Ribeiro, à qual reagiram de forma própria cada um dos três oradores convidados. João Monjardino, arquitecto de profissão e praticante de surf, começou por contextualizar a orla costeira da ilha Terceira, referindo os 90 quilómetros de perímetro, dos quais “apenas” 3,5 (3,88%) estão disponíveis para uso social, e alertando para o facto de “nas últimas duas décadas” se terem perdido 1800 metros de frente costeira.

De seguida lamentou alguma “falta de imaginação” nas actividades marítimas que se praticam entre nós na dita época baixa, fazendo um “repto” para inovar, aproveitando o potencial “imenso” que o mar proporciona. Relembrando que a responsabilidade do “bom uso” da costa marítima cabe a todos, João Monjardino não deixou de focar o lamentável estado da orla na zona do cabo da Praia onde “à custa da inovação e do desenvolvimento, que são ferramentas essenciais” o mar está poluído e a situação tarda em resolver-se.

Citando uma conhecida publicação mundial de surf, mostrou como se pode passar uma imagem “triste e terceiro-mundista” de um local aprazível como a nossa região e as nossas águas. E não deixou de apontar a má “infra-estruturação” da zona industrial praiense como a causadora dos problemas. Mas sempre com uma visão “futurista e optimista, ciente de que a realidade pode e deve mudar para melhor”, concluiu.

Jorge Vieira, responsável pelo Angra Iate Clube, foi o segundo a falar, e começou versando a “cultura náutica” das nossas gentes como estando em “baixa”, dando como certo que apenas a “aposta” nos escalões de formação pode sustentar uma “mudança de atitude” das pessoas face ao mar, isto numa clara alusão às dificuldades da prática desportiva para as actividades marítimas.

Alertando que “as autoridades responsáveis” devem contribuir para essa mudança de atitude, lamentou a “falta de exigência” dos terceirenses nas condições que lhes são oferecidas para aproveitar as valências do mar, exemplificando a afirmação com as “obras de remodelação do Porto das Pipas, que não trouxeram sequer as condições mínimas para a prática das actividades náuticas”, referiu.

Falou também da realidade actual de quem investiu no âmbito da acção marítimo-turística, realçando o incremento de “qualidade” que tem sido levado a cabo nos últimos anos, altura em que não se entendem as dificuldades sentidas para “a formação de navegadores de recreio”, e deixando ainda um repto no sentido de dar “mais vida” às marinas da ilha, cujos picos de utilização se prendem com as provas de vela de cruzeiro que se vão organizando entre nós.

João Rodeia, da Universidade dos Açores, foi o responsável por uma abordagem científica da nossa visão do mar, isto na vertente do conhecimento que se propunha aos presentes. Lamentou, desde logo, “erros crassos” que se vão cometendo nas obras feitas pela orla costeira, deixando no ar que o conhecimento “existe, mas por demasiadas vezes, não se aplica”, isto também numa menção clara ao areal da Praia da Vitória e ao “uso e abuso” comercial dado à areia, um elemento “fulcral para se manterem as características do lugar, o que parece descurado gravemente”. João Rodeia alertou para o contra-senso das exigências feitas a quem “tem ligações ao mar”, que vão impedindo o acesso do cidadão comum ao mar, assim como dos mais novos.

Referindo que a “motivação” tem de ser criada e o papel da “investigação como caminho mais curto para atingir fins”, João Rodeia disse “não compreender” uma certa aculturação marítima que é emergente, sendo que “os miúdos são o nosso futuro e é urgente dar-lhes um contacto vivo com o mar”, referiu como um repto às próprias instituições e estabelecimentos de ensino que “pecam” pela ausência nessa vertente.

O espaço dedicado ao debate foi animado e permitiu diversas intervenções, a maioria em aberta interacção com o painel de convidados, e onde se denotou uma certa “frustração” generalizada pela forma como são geridas as nossas ligações com o mar. Em termos de infra-estruturas básicas foi feito um “alerta” para obras futuras; em termos de promoção turística foi visível que haverá muito mais a fazer e que é até patente uma certa “asfixia” em relação aos investidores e face às necessidades que se apresentam nos Açores. Na parte da formação humana e educacional foi deixada uma palavra para os desportistas náuticos que, numa região atlântica e incompreensivelmente, têm “poucos apoios e escassas oportunidades de singrar no exterior”.

“Uma legislação complexa e um sem-número de entraves” foram as causas apontadas para a actual escassez de actividades marítimas “diárias e corriqueiras”, a que a nossa realidade geográfica e histórica nos devia “obrigar” Foi também reforçado o factor “misticismo” que o mar encerra como preponderante na dinamização que pode ser dada em diversas frentes, deixando-se claro que as próprias denominações das duas cidades terceirenses (Angra do Heroísmo e Praia da Vitória) são, intrinsecamente, causas do sua forte ligação ao mar, qualidade que, no entender de muitos dos presentes, “tem caído no esquecimento dos decisores políticos”, mas sempre com um sentido de que “no horizonte” haverá “mais e mais a fazer”.

 

IDEIAS            

 

&    

             

DEBATES     

De passagem...

28.02.08, MSA

Decididamente ir ao café a meio da tarde, de preferência quando a clientela é em maior número, pode proporcionar um acréscimo ao nosso conhecimento empírico. Refiro-me, naturalmente, às "bocas" e piadas que por lá passam...

Esta é "fresquinha" de há uns dez minutos atrás:

-"Qualquer dia a reforma é aos 100 anos...que é para eles terem mesmo a certeza que não pagam nada a ninguém... "

Capicua(s)...

28.02.08, MSA

Um número é capicua quando se lê da mesma maneira nos dois sentidos...

 

Lembro-me perfeitamente de ter 11 anos. Estava no Ciclo e era, à altura, um rapaz ligeiramente baixo (tirara o B.I. no ano anterior com 1m45...) e bastante magro. Adorava andar de bicicleta e, no final do 2º período, lembro-me de ter tido quatro "5" e seis "4" como notas escolares. Não estudava nada e gozava ainda do "andamento" precoce da escola primária...

Os 22 anos terão sido (talvez) a idade mais intensa que passei. Ansiava por sair da Terceira, o que só fiz um ano mais tarde, já trabalhava como jornalista no Rádio Clube de Angra e fui adjunto da Comissão da Tourada dos Estudantes. Estudava à noite, na área de letras, depois de perder três vezes Matemática do 11º nas aulas diurnas. E a vida nocturna era o mais activa possível...

Já tenho 33 anos. Fiz há cerca de uma hora e nem sei o que se vai passar nos tempos mais próximos. Felizmente sou casado com quem gosto há sete anos e meio e só me falta mais espaço. Para nós e para aguardar pelo sol e pelos sorrisos. Continuo a escrever e a acreditar que há mais gente boa do que má e que os valores da sociedade não estão, de facto, invertidos. Mas, a cada 11 anos passados, essa minha noção vai perdendo imensa credibilidade...

Euro "passa" de dólar-e-meio...

27.02.08, MSA

No comments...

 

O euro ultrapassou, pela primeira vez na sua história, a marca de 1,5 dólares, aproveitando os menores sinais de resistência da economia europeia, face à acumulação de maus indicadores norte-americanos....

A moeda única europeia subiu ontem até 1,5047 dólares, um novo recorde histórico que anula a sua anterior marca de referência, a 23 de Novembro do ano passado, de 1,4967 dólares.

Discutir o Mar...

27.02.08, MSA

IDEIAS            

 

&    

             

DEBATES     

Prossegue hoje a série de encontros “Ideias & Debates”, eventos abertos ao público e cujo mote é simplesmente pôr a sociedade açoriana, e particularmente a terceirense, a discutir as temáticas actuais que mais a afectam.

O Mar, na sua vertente lúdica e de conhecimento, foi o tema escolhido para a segunda sessão, que terá lugar no “Riviera Café”, na Praia da Vitória. Segundo uma nota da organização “quando olhamos à nossa volta os sentidos inebriam-se de azul”, e para quem nasceu “nestes torrões de lava perdidos entre o Velho e o Novo Mundo” o Mar é um elemento fulcral, com o qual nos “habituamos a conviver, estando rodeados pela imensidão do azul oceânico”. Os oradores convidados são o arquitecto João Monjardino, Jorge Vieira e o Professor João Rodeia.

Mas, e porque “o Mar é como o ar que respiramos – não o vemos nem o sentimos”, o grupo que dinamizou a iniciativa quer pôr os terceirenses a “pensar no mar”. Visível no texto que antecede mais este encontro é a ideia de que “andamos de costas voltadas para o Mar, não aproveitando todo o seu potencial nem todos os seus recursos”. Considerando o Mar como “o nosso maior património e o nosso maior bem”, com esta segunda edição do “Ideias & Debates” pretende-se encarar o nosso mar “de frente”, tentando ver as razões de só estarmos “com ele de Junho a Setembro, estando ele ali todo o ano”… 

Há dez anos, Lisboa e Portugal convidavam o mundo a mergulhar no futuro. Os Açores associaram-se a essa que foi uma das maiores iniciativas mundiais de homenagem aos Oceanos – a Expo '98. Passada uma década ficam no ar algumas dúvidas: “Como estamos? Continuamos a amar o Oceano como em 1998? Cumprimos os nossos desejos de então? Soubemos viver o Mar?”. Tal como há dez anos, o “convite repete-se: Venha mergulhar no futuro”, é este o mote para o “Ideias & Debates” desta noite.

 

Avanços e apertos.

27.02.08, MSA

O estacionamento da Aerogare das Lajes, durante a intervenção de fundo...

 

Já muito se escreveu e debateu (embora sem qualquer efeito prático...) sobre as obras de remodelação da Aerogare das Lajes, uma estrutura que o nosso Presidente do Governo avançou como sendo "a melhor dos Açores"...

Pois bem, para quem embarca na "tal" melhor aerogare da região (ou pelo menos na que se destina a ostentar tal epíteto...) já se sabe que a ordem é escassa e as atribulações uma constante, mas estas linhas têm como tema de fundo apenas e tão só o estacionamento reservado às chegadas (sim, porque para as partidas ainda se estuda e resolve...), espaço que recebeu uma intervenção de raiz durante longos meses, pelo menos assim a espera o indicaria. A verdade é que, passadas as fastidiosas obras, não é difícil descortinar o evidente. O número de carros que o dito parque agora alberga é mais pequeno que antes, com a "vantagem" de que o acesso se tornou mais difícil, ficando claro que, a qualquer chegada que se preze, o recurso à circulação exterior se faz em meia faixa...pois a outra metade tem carros estacionados. Isto para não falar do eterno problema da saída dos passageiros, onde os mesmos se amontoam dentro e fora do edifício.

Fica o comentário...sempre à espera do final das obras. É que do adro já sairam há uns tempos... 

Horário.

27.02.08, MSA

Já sei que daqui a bocadinho estás aqui.

Afinal nem demorou quase tempo nenhum. Não tarda nada e já sorris...

Lisandro...LOPEZ!!!

25.02.08, MSA

Não sei o que significa o gesto, mas ele que o vá fazendo muitas vezes...!

 

Depois da derrota europeia frente ao Schalke 04 ouvi de vários companheiros do dia-a-dia as esperadas "bocas" da reacção, isto porque as suas equipas, que aqui há umas semanas foram despromovidas da "Champions", até tinham seguido em frente na sua campanha pela Taça UEFA.

No fim-de-semana que passou, e estranhamente, pouco ou nada me pareceu sair, em jeito de comentário futebolístico, dessas mesmas afoitas gargantas de há uns dias atrás. Sem querer aglutinar num mesmo texto a minha alegria azul-e-branca com a técnica, finalmente explanada em pleno pelo relvado do Dragão, do avançado Lisando Lopez, temo que já seja (pelo menos por esta época...) tempo de alguma resignação das hostes lisboetas. Isto enquanto guardo esperanças de que o meu FCP siga em frente na Europa, o que não se afigura, de todo, fácil. Ou enquanto vou roendo as unhas a cada jogo em casa e me arrepio ao ouvir festejar um golo na Invicta. Fica o grito aplaudido das bancadas aquando da saída do astro das pampas no passado Sábado: Lisandro...LOPEZ!!!

Recordando o José Berto.

24.02.08, MSA

Em Agosto do ano passado, e após nove anos de "espera", voltei à Graciosa. Uma ilha com uma gente e lugares onde me sinto bem, e sobre a qual criei, desde os meus doze anos, afinidades e gosto de coração. Ao contrário do que pensava escrevi pouco naqueles dias de paz e (bastante) sossego. Mas ainda deu para a primeira crónica em mar alto...

Um dos motes para um hipotético texto seria a ligação estranha que me, há uns bons anos atrás, nasceu com o Maestro José Berto, figura ímpar e de violentos dotes artísticos, que me atraiu desde miúdo. Mas passou-se todo o Verão, e até se entrou no novo ano, sem eu alinhavar palavra sobre o excêntrico músico e poeta. Há umas semanas conclui que não o faria. Aconteceu ao ler uma crónica deliciosa com a sempre saborosa prosa de Victor Rui Dores, publicada na revista do "D.I. ".

Com a sua simpática autorização aqui a reproduzo na íntegra, podendo acrescentar que o livro "Mar de Escamas" tem ilustrações do meu tio António Azevedo...e que o escritor, agora radicado no Faial, disse tudo que eu nunca saberia levar às letras. A música e o mar agradecem...


José Berto
por: Victor Rui Dores

Guardo da minha adolescência terceirense as mais vivas recordações de um homem deveras singular: o José Berto, figura incontornável do meu imaginário afectivo.
Nascido em 1933 na então freguesia da Praia da ilha Graciosa, o José Berto frequentou o Liceu de Angra e, mais tarde, concluiu, com distinção, o curso de piano no Conservatório Nacional de Lisboa. Entregou-se à música de alma e coração, tendo exercido actividade docente em Angra do Heroísmo e na Praia da Vitória. Nos anos 50 e 60 do século passado, fez parte da Orquestra Filarmónica de Angra e foi presença assídua nos Serões Músico-Literários nas Festas de São Tomás de Aquino, no Seminário de Angra do Heroísmo. Privou de perto com gente da cultura angrense, como o investigador João Afonso, o poeta Emanuel Félix, ou o pintor Rogério Silva. Também se dedicou ao teatro e à poesia e, sobretudo, à boémia… Embriagava-se de vida e costumava dizer: “A noite da boémia tem que ser verdadeiramente sentida, gozada, amada”…
Ah, o José Berto! Estou a vê-lo nos bailes do Liceu de Angra a fazer a sua “perninha” com os conjuntos musicais “Os Bárbaros”, “Flama Combo” ou “O Açor”, cantando com emoção poética:

“Saudade dessa mulher
Meu peito sente…”

Para nós, estudantes com sangue na guelra, aquela música (da sua autoria) era um “slow” dos bons, daqueles que, como se então se dizia, dava para “esfregar a cavalinha” com as meninas que se deixavam apertar no calor escurecido da noite…
Já então o José Berto era um nobre vagabundo, desbocado e desprendido dos bens materiais, dilemático e dialéctico, boémio e insolente, fumador feroz, filósofo de barbas e rebeldias… Temperamento de génio incompreendido, homem de talento desatento – apenas conhecido pela estúrdia das suas noitadas e por ser o autor do hino do “Lusitânia”.
Recordo também as animadas viagens inter-ilhas, a bordo do “Ponta Delgada”, com o José Berto a arrancar do seu acordeão noctívago belíssimas melodias e a beber quantidades industriais de vinho…
Mais tarde, já aposentado, o José Berto fixou-se na ilha Graciosa. E quando eu lá ia de férias, encontrava-o à mesa do café junto à praia, à conversa com os amigos, de cerveja à boca, sempre susceptível, judicioso, penteado de maresia e de barbas pensantes, com aquele sorriso de secreta ambiguidade. Continuava igual a si próprio: insatisfeito e contraditório, incómodo e incomodado, dotado de uma consciência crítica e de uma visão cáustica sobre os outros, inteligente, perspicaz e universal da vida e do conhecimento das coisas.
Boémio por condão e por gosto, quando ele estava com o “astral” puxava do retumbante acordeão e animava quem o quisesse ouvir. E com ele mantínhamos longas e bem dispostas conversas vadias… Costumava ele contar episódios das turbulentas viagens que empreendera por terras americanas, bem como das tocatas em insólitas paragens das Caraíbas e Vietname – e assegurava-nos que havia tocado para um tal D. Gergoliani, chefe da Máfia americana…
Um dia, sob o efeito de uma tremenda bebedeira, ele passou uma tarde inteira a tentar convencer-me que Jesus Cristo era um extra-terrestre… Depois passava por fases de alucinação satânica, ou de inquietações religiosas e metafísicas. Dizia a todos que tratava Deus por tu… E dividia os homens em cinco categorias: os boémios, os alienados, os idiotas, os cretinos e os loucos.
O José Berto tornara-se um homem cercado e atormentado, náufrago de si próprio… Viveu os últimos anos da sua vida misturando música com bebida, boémia e poesia. Vítima da chacota dos outros, nunca perdeu um certo sentido de dignidade. Três anos antes de a cirrose o levar, publicou um belíssimo livro de poemas: Mar de Escamas (edição da Câmara Municipal de Santa Cruz da Graciosa, Angra do Heroísmo, 1997), em que fala do destino da vida humana no teatro do mundo. Atento ao desconcerto do mundo, e questionando Deus, o Homem, a Solidão, o Ser e o Não-Ser, o autor denuncia a falsidade, o fingimento, a hipocrisia e o egoísmo dos homens e renuncia ao quotidiano comezinho e à trivialidade da vidinha. Vivendo no microcosmo da ilha-mãe, o poeta parte então em busca de uma harmonia, de um deus ex-machina, escrevendo versos certeiros que são de raiva e ternura, de amor e ódio e questiona o triunfalismo científico:

“O último invento matou o teu filho”. (pág, 55)

A última vez que vi o José Berto fiquei com a sensação de estar perante um barco velho abandonado no cais… A sua decadência física era visível: envelhecido, a pele macilenta, os olhos baços, as longas barbas a escorrerem cerveja, sujidade e desolação… A solidão pesava-lhe como um fardo. Foi a sua fase negra, sórdida, macabra e grotesca. Mas não perdera a enorme lucidez. Falou-me que tinha pronto para publicação mais um livro de poesia, cujo título seria: Quando os mortos vierem fardados. E citou-me estes versos que mostram a sua alma de poeta:

“Ai o músico
se poeta sente
ai o poeta
se músico consente”.

Era assim o José Berto – músico e poeta, um homem bom que se deixou enredar nas vicissitudes da existência e derrapou no plano inclinado da vida.

Música solidária.

23.02.08, MSA

Um serão agradével onde imperou a qualidade...

 

Ontem foi uma boa oportunidade para passar um serão diferente em Angra. Pelas mãos da Cáritas local, realizou-se um espectáculo de solidariedade no Centro Cultural e de Congressos, evento cujo cartaz de artistas e ambiente proporcionou momentos bem passados. Se me permitem até a comparação, o local parecia até de uma outra ilha mais a Oriente, onde este tipo de acontecimentos são bem mais usuais, sendo deles adepta a massa da sociedade informada e de bom gosto. Pode ser que pegue...

As actuações tiveram início pelas 21h30, começando a gala com dois interessantes diálogos das "Bodas de Fígaro", a cargo das sopranos Luísa Alcobia e Cristina Meireles, com Olga Lysa ao piano. Um registo a que, confesso, estou pouco habituado, mas que apreciei muito a sério. Foi talvez o ponto que mais me tocou do espectáculo. De seguida lugar para a actuação da Orquestra de Sopros da nova Escola Tomás de Borba, uma formação coesa e com andamentos seguros a demonstrar trabalho. No entretanto foram congratuladas as firmas que colaboraram com as iniciativas da Cáritas na Terceira, sendo depois agraciados os alunos que terminaram a sua formação, fruto desse mesmo empenho, tendo sido distinguido por mérito social o Prof. Juvenal Castro, conhecido criativo e empenhado docente. Na mira dos presentes esteve depois, de novo, Luísa Alcobia, desta feita acompanhada por Oleg Gunko (clarinete), e novamente Olga Lysa (piano). A sequência musical levou-nos depois ao espectro regional e tradicional, através do agrupamento "Charamba", onde primam Júlio Silva (violoncelo), Vitor Lima (violão), José João Silva (viola de arco), Francisco Rocha (melódica) e Lázaro Silva (viola da terra). Um conjunto de bons músicos onde as nossas sonoridades são tratadas a preceito. Após o intervalo, e também depois das palavras da Engª. Anabela Borba, líder regional da Cáritas, foi a vez de ouvir com gosto mais uma actuação da Orquestra "Angra Jazz", sob a batuta do maestro Klaus Nymark, sem dúvida o exponte local daquele género musical. As peças foram sendo levadas a bom ritmo e cativando os presentes, assim com esquecidas foram algumas das deficiências de som que prejudicaram actuações anteriores.

Bom grado a amplitude da sala do CCAH, continuo a preferir ouvir música no Teatro Angrense. Não sei, mas talvez por ser menos frio e, sem dúvida, mais sumptuoso. Quanto ao evento em si, parabéns a quem para ele trabalhou e que se repitam iniciativas semelhantes. Foi uma boa noite de sexta-feira.

PS-Também num registo diferente, confesso que acho graça a esta crónica "social". Escreve-se bem...

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