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..."É Já Domingo, Domingo Gordo! Grita incessantemente o "speaker" de serviço no "WC", instalado por cima do Armazém Zeferino, na Rua da Sé...". Penso que, todos os anos, poderia começar assim mais um texto em que me referisse a esta verdadeira paixão de Entrudo que é a Garraiada dos Estudantes. Sem data precisa (será que ainda se vai investigar isso com rigor? Não deve ser difícil...) para lhe dedicarmos a respectiva idade, a Tourada dos Estudantes caminhará, a passos largos, para o século de existência. E nela se juntam nomes, valores, estratos sociais e grandes figuras desta nossa Terceira. Não há, nas últimas gerações da maior parte das famílias (angrenses, acima de tudo), uma história ou episódio carnavalesco que não meta pelo meio uma referência à Tourada. Desde os idos tempos do antigo Liceu Nacional, onde o reitor-Dr. Pato François-nunca interpôs obstáculos à realização do espectáculo...desde que a "medida" não fosse ultrapassada; tempos onde o percurso do Cortejo-inverso ao actual- se fazia subindo a Rua da Sé (então da República...), em direcção à velha Praça de Toiros de São João; e histórias não devem faltar das faenas atrevidas no antigo redondel onde a falta de trincheira originou sempre episódios de contar e recontar. Posso aqui recordar um engraçado episódio de um meu tio-avô (já falecido) que, em terrenos de aflição, se guindou pela porta dos curros dentro (!), onde o panorama decerto não terá sido o melhor.
E, avançando nas datas, e sem deixar para trás factos importantes (mas impossíveis de referir numa simples crónica), contam-se às maõs cheias as travessuras das viagens até à Praia da Vitória, onde a Tourada se realizou após o Sismo de 80, ou as subidas até à Grota dos Calrinhos para alcançar a Praça "José Albino" da Pedreira. Enfim, um manancial de histórias que um dia serão importantes de juntar.
Mas o motivo que me leva a escrever sobre a "nossa" Tourada é mesmo esse sentido de posse que temos sobre as coisas de que gostámos. Posso considerar que, em mais de uma década, pelo meio da qual tive o orgulho de ser membro da C.O.T.E.-Comissão Organizadora da Tourada dos Estudantes, me sobrou tempo para apreender todos os meandros e problemas desta antiga tradição. Assim como ganhei um gosto enorme, que encontro em muitas mais pessoas, por um evento que desenvolveu na sua história um papel importante de crítica social, despoletar de carreiras, ganhos de amizades e espírito empreendedor. Enfim um património, já de si rico, mas que temos o orgulho de poder partilhar pelo passado, presente e futuro. Assim como uma coisa que vamos vivendo desrespeitando por alguns dias o andar do calendário. E é vê-los, aos antigos participantes, de olhos em bico frente ao cortejo, arrependidos de alguma coisa que deixaram por fazer ou resignados por terem tido de apanhar a caravana do tempo. Que não pára, e que nos ensina a dar valor a coisas tão pequenas...que não a "nossa" Tourada!
Depois de dois anos em que, para mal dos meus pecados, passei o Carnaval longe desta ilha lilás, foi com agrado que verifiquei a força e a entrega com que mais uma nova vaga tomou rédeas à antiga tradição. Depois de, em 2002, a Tourada ter estado em risco sério de terminar-ou pelo menos de não se realizar por uns tempos...o que iria dar no mesmo-, e de, nesse mesmo ano, terem sido muitos antigos participantes a "pegar" na tarefa de a recolocar no seu merecido lugar, é reconfortante ver míudos e míudas de 14, 15 e 16 anos a reiniciar um ciclo. Foi com alegria reinante que os vi gritar e rir no renovadíssimo Tentadero "RB" (onde estavam as silvas, a lama e as pedras?...) em dia de Tenta. Foi com muita vontade de ter gente nas bancadas que, Domingo passado, o mesmo grupo deu a Volta à Ilha, invadindo de barulho e tropelias as freguesias por onde iam passando. Foi com a curiosidade alerta, que eu também já tive, que os vi perguntar sobre outros tempos e querer confirmar histórias (daquelas a que cada um vai acrescentando um ponto e que acabam por nada ter a ver com a versão original...!) antigas para, numa normalíssima vontade, as compararem com os tempos de hoje. Com algumas condições que só beneficiam quem põe agora de pé esta verdade, é com bons olhos que se olha o futuro desta tradição. Afinal, numa terra onde se realça tudo que venha de outras épocas, porque haveria de ser diferente com a "nossa" Tourada? Para lá de o Arranhão ter passado de amarelo a verde, a metodologia das construções, dos cortes, das caloiradas, das noites mal dormidas e de um ou outro grão na asa mantém-se inalterável. E ainda bem que assim é. E, como seria de esperar, estas linhas servem também de apelo. O primeiro direitinho a São Pedro e às suas capacidades reguladoras do tempo climático. Que deixe à mostra mais um Domingo Gordo de sol e bons ares. O outro a todos os que, ano após ano, emolduram os passeios da nossa cidade na altura do Cortejo, e que compõem de cores garridas as bancadas da Monumental "Ilha Terceira". Não deixem de ir e de também participar nesta festa. Afinal a Tourada dos Estudantes já era interactiva antes mesmo de sabermos que essa capacidade existia...!
Por último gostava aqui de listar todos os Presidentes da Tourada que fui conhecendo e ajudando (ou não) ao longo de vários Carnavais. Apenas porque neles personalizo as muitas dezenas de cómicos, toureiros e fazedores de gargalhadas afins, que deixaram as orelhas "quentes" a muito boa gente da nossa terra. Por isso para o Pedro Fonseca, o João Simões, o Luís Vieira, o Marquinho Sousa, o Luís Mendonça, o Steven Simões, o Ricardo Costa, o César Fonseca, o Luís Alves, o Holger Melo, e o Artur Freitas, um muito obrigado por todas essas horas e imagens. Para o Pedro, o Francisco, o Sebastião e o Rodrigo, os votos de que tudo corra bem e vá continuando assim. A esses desejos acrescento um, que ainda há poucos dias escrevi a pedido de um colega de profissão. De que a minha geração nunca caia no erro triste de dizer "-No meu tempo é que era bom...". A Tourada é sempre boa. Viva a Tourada dos Estudantes!
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