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PORTO DAS PIPAS

miguel sousa azevedo - terceira - açores

PORTO DAS PIPAS

miguel sousa azevedo - terceira - açores

Depois do bacalhau e do peru… (crónica)

27.12.10, MSA

Ano novo, vida nova...ou não.

No frio pós-natalício sinto (pelo menos) três vontades indissociáveis: Comer, ler e escrever. Comer porque não vou nessa de ficar enjoado após consoada e almoço, até porque a minha relutância face aos doces me ajuda a ter sempre uma margem de manobra apreciável. Ler porque, mesmo se estou em briga aberta com os livros há uns tempos, os momentos passados em puro ócio me levam a devorar linhas e parágrafos, qualquer que seja o tema e, nos dias que correm, qualquer que vá sendo o suporte. Escrever porque, como existe o intervalo de fazê-lo por obrigação, se vão avançando ideias para projectos que quase sempre não passam o escuro da noite, mas cujo alinhavar desperta sentidos e mecanismos, em tudo úteis nos novos meses do ano a estrear.

Nestes dias, habitualmente de férias e quase obrigatoriamente de contrastes, observo as pessoas de forma diversa. O sentimento geral é, ou foi, de festa, mesmo se a realidade nacional nos indica um estado de depressão, pelo que, como no restante ano, as aparências iludem. Assim, o Natal não será mais do que a continuidade dos meses anteriores, em que importa mostrar abundância, mesmo se o pão passa e repassa no molho do almoço para disfarçar as necessidades. Numa terra de emoções e tradições, onde festejar, comer e beber se unem de barriga em barriga, cada vez mais a consoada antecede nova comezaina, afinal o corre-corre quase impede descansar e gozar em família o gozo de uma comemoração que muitos até já esqueceram. O nascimento de Jesus deu lugar a um consumismo atroz, com os gadgets da nova era a suplantarem em grande escala os sentidos da união e da partilha, e com o coro de SMS a vencer as vozes da missa do galo. Os sinais da crise esbatem-se na ânsia de passar umas horas de sorrisos, mesmo se tanta criança abre um presente com os mesmos automatismos de desembrulhar um rebuçado, que saboreia enquanto é doce, remetendo-o ao esquecimento em minutos. A massificação que nos aproxima também nos afasta, por mor de uns tantos rótulos, por imposição de umas tantas modas, por influência das rotas internacionais do comércio, esse ente que os misteriosos mercados regulam…

Mas mais preocupante que as mudanças nos hábitos e interacções da sociedade é, para mim, o irrealismo reinante no poder. Nos tempos que correm, e quando vemos os governantes apelarem à solidariedade para ultrapassarmos em conjunto as adversidades, fica-me a pulga atrás da orelha – possivelmente uma pulga proveniente de uma qualquer rena em rota de colisão… -, afinal, são estes os mesmos governantes que não se escusam à mínima mordomia e que gastam a rodos na hora de publicitar intenções de obra ou de renovar cargos. E, por estes dias, em que o mar bate forte e as ondas levam longe as ansiedades, resta-nos a consolação tecnológica de termos o Cruzeiro do Canal novamente a navegar. Viva o progresso e feliz 2011 para os nossos responsáveis. Também…

 

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