Álvaro Monjardino foi longe, afirmando que a Terceira, “na pequenez dos seus 400 quilómetros quadrados e das suas 55 mil pessoas”, é o lugar do mundo “com mais intensa tradição e vivência da festa do toiro”, conforme o provam “as centenas de manifestações anuais e o léxico local”. Como se calculava abordou também as polémicas relativas “às investidas da comunicação social”, numa realidade que envolve “o toureio de morte e a sorte de varas”, um tema caro aos aficionados da terra, que viram agora consagrado, no recentemente aprovado estatuto político-administrativo regional, “a legitimidade para legislar com independência sobre os espectáculos taurinos”. Uma liberdade que, e face aos 12 anos de prática da sorte de varas na Terceira, o único local no país onde a mesma se fez legalmente, dá “liberdades que ainda nem foram bem assimiladas”, explicou já após encerrar uma comunicação eloquente e inteligente.
Mesa Redonda: Política e Toiros (intervenções)
(apesar da excelência da tradução em simultâneo, e à semelhança da maioria dos presentes, preferi ouvir os intervenientes espanhóis na sua língua de origem e ao vivo…e parece que prevaleceu o “salero” na audiência…)
Miguel Cid- Político espanhol, antigo alcaide de Ciudad Rodrigo e presidente da “Mesa del Toro”, associação criada por alguns euro-deputados e amigos da “fiesta”, que tomou rédeas a uma luta pela sua defesa e manutenção no velho continente.
Realçou a proibição actual de haver touradas nas Canárias e a declaração anti-taurina em andamento na Catalunha. Dentro da agremiação “Mesa del Toro”, personalidades de todos os quadrantes políticos e sociais actuam em conjunto por um fim comum. “Não se pode descurar a defesa da festa, porque ela não se defende por si própria”, alertou. Segundo Cid, “a elevação no modo de fazê-lo é a certeza de que todos a escutarão e poderão entender”, acrescentou, frisando que “os políticos espanhóis, que são aficionados, estão decididos a fazer essa defesa”, numa mensagem de muita coerência e baseando a sua opinião em factos reais da vivência de “nuestros hermanos”.
Xavier Marquez Lopez– Senador do Partido Popular em Sória, às margens do Douro espanhol.
Começou por dizer que “não imaginava a paixão taurina que havia na Terceira”. De seguida, ressalvou que “a tauromaquia é uma actividade cultural, se bem que multi-facetada em grande escala, de forma mesmo transcendental”, explicou. A dicotomia política/toiros tem sido abordada, segundo disse, “por muitos autores em Espanha, que remetem unanimemente às praças de toiros a realidade de perceber a magia da actividade da festa”. A política, defendeu, “deve então reger todas as actividades, na óptica da acção dos governantes”, mas a acção popular “é também política, a partir da opinião das gentes e, no mundo taurino, essa é uma verdade clara”, afirmou. Por isso, realçou, as motivações anti-taurinas “têm a mesma idade da tauromaquia, pelo que a divisão de opiniões e acções vem de longe”. Para Lopez, nestes fóruns, “não se defende nada em concreto, apenas e tão só a acepção de que o mundo taurino é global e muito rico”, com “valores erguidos e firmados”, afiançou.
David Perez– Jovem político da Catalunha, parlamentar desde 2000 e antigo porta-voz do Ministro do Trabalho. Activo defensor da festa brava catalã.
Na sua intervenção esclareceu que há uma proposta de lei, “que será discutida brevemente na Catalunha, e ainda em processo de angariação de apoios, que visa liminarmente, a abolição da actividade taurina”. Numa explanação da realidade que vive, confirmou existirem aficionados que “não se encontram na praça” e outros “que não assumem publicamente o seu gosto”, numa nuance contra-natura pois, pelas bandas catalãs, está “mal visto ser taurino”, afirmou. Perez disse já ter sido “alvo directo de ataques pessoais pelos anti-taurinos”, o que não o vai impedindo de respeitar a opinião dos referidos, mesmo se a aficion “está em minoria em Barcelona e seus arredores”. É a morte do toiro na praça “a fonte da discórdia pública na Catalunha”. O deputado explica que “é o facto de se fazer uma festa” e não, hipocritamente a defesa dos animais “a estar em causa no debate”, o que só comprova “a superioridade moral da defesa dessa mesma festa”, assumiu, acrescentando que os nacionalistas catalães “não querem uma festa espanhola, pelo que a pretendem proibir a todo o custo”. Fechou a defesa e a intenção da sua luta dizendo que “é a tradição cultural que fica posta em causa quando se impede quem possa desfrutar dela”.
Francisco Moita Flores– Presidente da Câmara de Santarém - terra de toiros - e conhecido escritor, guionista. “Opinion-maker” assumido.
Com ligações afectivas pessoais aos Açores, que especificou como “uma espécie de namoro às ilhas”, explanou as referências sem fronteiras das suas origens na raia alentejana, vizinha a Espanha, e dos seus encantos. Referiu-se à hipocrisia reinante do “processo” de Barrancos, onde a morte do toiro foi autorizada, mas sem fito ideológico ou gosto manifestado, numa clara manobra (apenas) política. Na sua óptica o preconceito da defesa dos animais “está inquinado de pressupostos falsos, no que toca à tauromaquia entre nós”. E citou Sophia de Mello Breyner, com um soneto que começa assim (e depois aferi…): “As pessoas sensíveis não são capazes/de matar galinhas/porém são capazes/de comer galinhas (…)”, como sendo uma metáfora useira nos dias que correm. Para Moita Flores a identidade dos países mediterrânicos e atlânticos, onde os toiros são motivo de discussão, vão sendo os mais atreitos às crises, mas também à massificação e à uniformização que tentam alterar as suas raízes e as tradições dos seus povos. “É uma massificação economicista, a que vivemos”, explicou, fazendo pensar a audiência e dando o mote de que “a festa taurina identifica as cidade e os lugares”, pelo que “discussão cínica” sobre a sua prevalência é “um atentado à individualidade e aos direitos, que se tentam alienar, por conta da dita massificação”. Depois do “combate” de Barrancos diz não existir “nenhum aficionado que aceite o mau trato de um animal que vá a lide”, pois que os ganaderos “são os primeiros a prezar e a honrar a vida dos seus toiros”. Esse, afirmou, é um direito fundamental “da terra, entre irmãos, e com inteligência sem censura”. Moita Flores fechou a sua intervenção inicial referindo-se à política lusa e ao facto de, “após três anos e meio como autarca”, poder dizer com direito de causa “que há toiros com mais nobreza, e que eu mais respeito, do que muitos políticos da nossa praça”...
Seguiu-se um animado debate, com intervenções pontuais, mas que foi activo e participado. Nota para a formação (que está em curso) em Portugal, por iniciativa do deputado açoriano - e terceirense - Joaquim Ponte (PSD, ex-edil de Angra), em conjunto com José Salter Cid e com o ganadero Ortigão Costa, de uma associação de parlamentares e ex-parlamentares taurinos, com o fito de defender a causa da festa brava. A mesma que motivou, ontem, e antes de nova chuvada gelada, a foto de família nos degraus da Sé. E um agradável almoço com menção clara à forma terceirense de bem receber. Olé!
(por motivos de trabalho não acompanharei o início do trabalhos de hoje – recomeçaram na Praia da Vitória às 10h30 -, mas tentarei aqui partilhar mais algumas horas deste Fórum entre nós…)